sábado, setembro 8

Florbela 2



1.
Ser poeta


Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!


É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!


É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
é condensar o mundo num só grito!


E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!



2.
Amar!


Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui...além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar!Amar!E não amar ninguém!


Recordar?Esquecer?Indiferente!...
Prender ou desprender?É mal?É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!


Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!


E se um dia hei-de ser pó,cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...


Estes serão, talvez, dois dos mais conhecidos poemas de Florbela Espanca.
A sua poesia é intensa, emotiva e tremendamente apaixonada. As minhas preferências vão para expressões mais depuradas dos sentimentos, e a única explicação que encontro para isso é que o carácter excessivo da sua escrita me assusta. Sinto que as palavras têm uma força imensa, e é necessário domá-las, para que os sentimentos não fiquem à mercê desse poderoso instrumento. Como se houvesse o perigo das palavras tornarem a realidade incomportável para um mortal. Como se tivessem o poder de a ampliar até ao infinito.

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