segunda-feira, abril 23

O Verdadeiro Método de Estudar

Atravessamos tempos estranhos?
(Talvez todos os tempos sejam estranhos!)

Mas por vezes sinto-me mergulhada nos mesmos problemas que Luís António Verney descrevia no VERDADEIRO MÉTODO DE ESTUDAR. Por exemplo, uma vez por ano, abria-se um carneiro no pátio da faculdade, os alunos de anatomia deitavam uma olhadela lá para dentro e depois, fortalecidos com aquele apressado vislumbre das vísceras do animal, iam estudar os catrapácios da tradição escolástica para fazerem os seus exames sobre anatomia... HUMANA. Para quê preocuparem-se com uma observação detalhada e orientada da realidade? Pois se tinham as melhores teorias dos melhores teóricos para resolver o problema!

E por que me lembrei disto?

Porque, há pouco tempo, foi debatido numa reunião de Conselho de Turma de 10º ano o seguinte facto: o professor de matemática tinha adoptado um novo critério para formar os grupos de trabalho na sala de aula; esses grupos, em princípio mas não de forma rígida, obedeciam ao conceito de homogeneidade de nível de conhecimentos. Ou seja: os alunos agrupavam-se sensivelmente de acordo com os respectivos níveis de classificação. O professor explicou que o critério tinha sido definido em reunião do Grupo de Docentes de Matemática, com o objectivo de tornar a avaliação dos trabalhos mais fiável e a aprendizagem mais efectiva, visto que, estando todos ao mesmo nível,
todos teriam que trabalhar para resolver as questões. Acrescentou ainda que tinha produzido frutos, visto que alguns alunos do nível baixo e médio tinham melhorado as suas prestações de forma visível. Recordou ainda o problema, já anteriormente referido, de que alguns alunos com potencial preguiçavam à sombra dos trabalhos de grupo, onde a presença de bons alunos era a garantia de uma boa nota para todos.


Um dos presentes indignou-se com este critério a ponto de afirmar que, se fora encarregado de educação LEVARIA ATÉ AO MINISTÉRIO a sua queixa. Invocou as "mais modernas teorias da educação" como garantia de que "os mais fracos aprendem com os melhores: é para isso que se fazem trabalhos de grupo".

Alguém, entretanto, lembrou que as teorias não são tudo, e temos que reflectir sobre a nossa prática e os seus resultados, tirando daí as conclusões adequadas.

Chamada à liça como possível aliada na censura ao colega de matemática, a responsável pelos Apoios Educativos foi peremptória: "A verdadeira inclusão começa pela formação de grupos homogéneos. Se o aluno sentir que outros são melhores do que ele, tem medo de participar, sente-se inseguro, e sai dali ainda mais convencido de que não é capaz. Se todos estiverem ao mesmo nível de conhecimentos, ganham confiança e sentem que podem fazer alguma coisa; e aí, realmente, PROGRIDEM!".

Seguiu-se um silêncio interessante.

Não somos burocratas, somos professores. As teorias são importantes, mas não podem esconder aquilo que a prática revela: uma e outra têm que servir para se esclarecer e aperfeiçoar mutuamente. De que serve a nossa experiência se depois a trocamos por um prato de lentilhas pronto a usar? De que serve a teoria se a usamos para SUBSTITUIR os nossos passos em vez de a usar para os GUIAR?

Parafraseando Kant, a teoria só por si é estéril, a prática sozinha é cega!

2 comentários:

Raimundo_Lulio disse...

"Não somos burocratas, somos professores". Embora ande por aí muita gentinha a fazer os possíveis para nos buracratizar.

Eurydice disse...

Pois, raimundo lúlio! Que a gente bem sabe que os serviços centrais assim o entendem. ;) Mas custa ainda mais ver isto portas adentro!