quarta-feira, julho 4

O Cargo Revela o Homem?


Cada vez mais, é minha convicção profunda que a natureza humana é a mesma, no essencial, desde a noite dos tempos. Uma das coisas que não mudou é o gosto pelo poder. E o poder corrompe. É preciso um espírito verdadeiramente livre para suportar a embriaguês, as lisonjas e as pressões inerentes ao poder. A simples perspectiva de obter poder corrói as pessoas. Nem que seja um pequeno poder, como o de fazer sofrer aqueles que dependem de nós ou aqueles que amamos.

A maioria de nós troca muita coisa por essa euforia de manipular e controlar. Alguns, mais perigosos, trocam as causas e os princípios por essa efémera experiência. Porque ela é sempre efémera, mesmo quando dura trinta anos ou o resto da vida.
Com lápide ou sem ela, o fim chega sempre a tempo de acabar com os poderes.

Não acho a nossa época pior do que as outras: entendo que, sendo esta a que conheço em primeira mão, é por isso mais fácil apontar-lhe os erros ou ressentir-me com as suas injustiças e incoerências.

Posto isto, é evidente que a traição anda no ar, que as grandes causas são trocadas por coisas que valem tanto como um hamburger rançoso ou uma capa nas revistas socialite. É evidente que o Paraíso está muito longe. É evidente que a sede de poder é o principal motor de muitos. Os projectos de poder pessoal ultrapassam tudo, matam tudo, escarnecem de tudo, envenenam tudo. E cobrem-se de véus de fantasia que fariam empalidecer o mais fantásticos dos ficcionistas.

Com isso, provam apenas a sua escravidão interior. A sua mesquinha condição de seres dependentes de teias de aranha para se sentirem vivos. Como tal, são sub-humanos, porque não reconhecem o Bem com motor da sua vida. O cargo revela as pessoas, sem dúvida. O modo como exercemos o poder diz tudo sobre nós enquanto seres humanos.

O pior é que a sua falta de liberdade condiciona a dos outros. A sua falta de grandeza amesquinha os outros. A sua pequenez amputa os outros.

E, no fim, morrerão como todos nós, mas terão uma lápide a condizer, grande e vistosa, para esconder a podridão que alastra sob a terra. Felizmente para eles, essa lápide não fará a avaliação do modo como exerceram o poder.

2 comentários:

""#$ disse...

Terá sido alguma coisa que eu disse?

Eurydice disse...

O puzzlle, Pedro, tem muitas peças... e o teu contributo analítico não é para desprezar, sem dúvida!...